Eu já tinha discorrido sobre o terrorismo televisivo pelo qual nos submeteram na infância. Nossa geração definitivamente tem coração de Chuck Norris, não é qualquer emoção mais forte que nos fará infartar no futuro, garanto. Mas aí no post abaixo eu tirei do fundo da memória a pobre baby Jessica, que caiu num poço quando tinha, sei lá, um ano e meio, e acabei lembrando que, meeeu, putaquepariu, as trasheiras cinematográficas que a gente assistia na infância não eram bolinho. Batendo um papo descompromissado e cibernético com amigos que passaram pelo mesmo trauma, consegui enumerar alguns exemplares da produção de cinema destinado ao sofrido público infantil da década de 80 e 90, que podem ser divididos em três categorias:
- Era pra ser feliz, mas tem uma tragédia no meio e a gente esquece a parte boa:
* Meu primeiro amor: imagina o teu melhor amigo morrer porque foi atacado por abelhas (!) quando tu tem, sei lá, dez anos e ainda ser velado na tua própria casa, porque tu mora na funerária. Choro até hoje, e muito, quando vejo a cena. E detalhe: hoje em dia quase não vejo, mas quando eu era piá, vivia sendo picada por abelha e duas das casas em que morei na infância foram invadidas por elas e por marimbondos. Aí, ok, o guri era alérgico a praticamente tudo, mas né?, vai que tu é alérgico também. Acho que não tem como saber ANTES de ser atacado por um enxame furioso.
* Convenção das bruxas: eu adorava mas quase me mijava de medo. E não era das bruxas propriamente ditas, nem porque eram carecas e narigudas, nem porque não tinham dedos nos pés. E, pasmem, não tinha medo de virar rato como acontece com umas trocentas crianças no filme. O meu pavor mesmo era quando aparecia a história da menina que ficou presa num quadro (uma tela, uma pintura, yes) por toda a eternidade. Cara, que trauma. Não superei.
* Super Xuxa contra o Baixo-Astral: antes de terminar o filme pintando arco-íris de energia com todos os vilões recuperados, a gente é obrigado a sofrer de pavor quando o Xuxo se transforma em malvado. Isso sem contar a viagem de ácido da Xuxa no meio do filme. Lembram disso? Acho que assistindo a esse trecho foi a primeira vez em que me senti bêbada. Fora que, convenhamos, vilão com dentes feios e sujos é o fim da várzea.
- É tenebroso, as crianças só sofrem e, o pior, aconteceu mesmo:
* Enchente - quem salvará nossos filhos?: olha, eu achava um pé no saco e confesso que nunca senti pena daquelas crianças chatas. Mas o filme é um festival de tragédia, uma atrás da outra, lágrimas e mais lágrimas. Tá certo que não era um filme feito pra crianças, então talvez não possamos culpar os responsáveis pela realização do mesmo. Pela veiculação, no entanto, agradeço ao pessoal do SBT, que sempre me fez ter uma visão distorcida de entretenimento.
* O resgate de Jessica: o filme que inspirou essa coletânea do terror mostra o sofrimento da mãe da Jessica, do pai, dos colegas da creche, da puliça, repórteres e bombeiros que tentam retirar o bebê de dentro do poço. Fiquei sabendo que a Jessica real teve parte do pé amputado à época, por complicações causadas pela queda e a falta de circulação. Porém, como consolo, quando ela fizer 25 anos, vai ganhar um milhão de doletas. Método SS de retribuição.
- É só pra sacanear a traumatizar a gurizada merrrrmo:
* A fortaleza: uns pavorosos seqüestradores com máscaras de personagens que a gente deveria admirar (Papai Noel incluso, acho que detecto a origem de outro trauma) resolvem, sem motivo nenhum, seqüestrar a versão australiana da professora Helena e todas as criancinhas de uma escola que fica mais ou menos no meio do nada, virando à esquerda. Elas se dão mal sucessivamente até que são corrompidas e descobrem the taste of blood.
* A colheita maldita: Baseado num conto de Stephen King, o filme não tem nada de macabro, porque é mal feito pacaraio, mas saquem só o conceito e digam se não é a bizarrice total: numa dessas cidades em que só tem milharal pra tudo quando é lado, as crianças ficam doidas duma hora pra outra e resolvem matar todos os adultos pra adubar o plantação de milho com o sangue dos defuntos. Elas passam a seguir uma religião pagã mucho louca, sacrificando todo mundo que adentra a cidade e a eles próprios, quando chegam aos 18.
* A cidade dos amaldiçoados: toooodas as (dez) mulheres de uma cidadezinha conservadora do interior ficam grávidas simultaneamente. Uma virgem inclusive. Aí elas parem no mesmo dia. As crianças crescem e andam em fila indiana, aos parezinhos (alou, Pasquale, te preciso). Era pra ser um número par, mas acho que um morre no parto. Tá, chutei os números e não vou procurar, porque a dívida de pequeno répti com o google não para de crescer. Enfim, o que não tem dupla não é tão malvadinho, é só meio mau. Mas os outros são mega cruéis e têm os cabelos prateados. Eles dominam as mentes das pessoas e elas se suicidam. Cristopher Reeve conseguiu anular o poder deles pensando num muro. Ou no mar? Acho que ambos. Mas a essa altura, as crias já tinham sacaneado todo mundo. Creio que aliens estavam envolvidos... talvez.
* Anjo Malvado: Macaulay Culkin, que já tinha nos feito sofrer por demais em Meu Primeiro Amor, surge tenebroso e assassinando bebês numa das histórias mais traumatizantes da nossa infância. Imagina um filme no qual, na cena final, a mãe da peste homicida tá segurando o demo e o primo bonzinho (Frodo) na beira de um penhasco e precisa escolher um deles pra salvar, o filho ou o sobrinho.
Bem, essa coletânea foi feita baseada na minha lesada memória e na confiança que tenho nos meus amigos, que relembraram alguns títulos. Portanto não confundam com jornalismo verdade, eu posso ter inventado quase tudo. Mas não sintam-se mal, eu não estou enganando a vocês e sim a mim.
De qualquer forma, acho que nunca fizeram tantos filmes nas quais as crianças eram más ou, simplesmente, a praga universal. E mesmo quando eles queriam ser legais, assassinavam a gurizada em massa pra nos dar lições sobre a existência. Eu gostaria muito de poder dizer - ainda tenho meu orgulho - que não sei mais o que andam mostrando pra pirralhada dos dias de hoje, mas eu sei, tá? E definitivamente o level de crueldade é bastante inferior. Mas devo dizer que isso me preocupa. Nós crescemos em contato com o lado negro da força, tudo quanto era desenho animado tinha, no mínimo, um vilão bem malvadinho, até o indefeso Ursinhos Carinhosos. Mas hoje em dia não, é só alegria. Aí eu concluo que nos saímos bem, apesar de tudo. E levanto uma questão muito bem colocada pela Emily: o que vai ser das crianças criadas a Barney? Chuto assasinos em série.
Ah! Se vocês lembrarem de outros filmes com o combo criança + crueldade gratuita, não se mixem e lancem aí nos comments. No futuro, o outro lado da moeda. Enumeraremos filmes que nos tornaram pessoas melhores. Por exemplo, o eterno Ferris Bueller nos ensinando o desapego material.
P.S.: gostaria muito de ter feito um leiaute que melhorasse a legibilidade do texto gigantesco, assim como sinto falta de imagens. Amo ilustrações, vocês bem o sabem. Os botões que me permitem configurar decentemente o post, no entanto, simplesmente desapareceram enquanto estive fora. Se alguém quiser logar aí e fazer a festa do negrito/itálico/espaçamento/fotos e multicores, sinta-se à vontade. Octi?